sexta-feira, 13 de setembro de 2013

As Traças...


Eram duas traças. Tinham ido parar ao meu
sobretudo, guardado no Verão, para voltar a servir no
Inverno.
As duas traças não me conheciam de parte alguma. Por
isso não podiam pedir-me autorização para se servirem, à
maneira delas, do meu sobretudo. Naquele guarda roupas

havia mais roupa pendurada, mas o sobretudo azul-escuro,
de lã macia, era o que mais lhes convinha.
Quando, chegado o Inverno, dei com dois buracos na
lapela do meu sobretudo, barafustei:
– Malditas traças! Não há naftalina que as detenha.
Talvez estas traças estivessem constipadas ou a naftalina
que eu tinha espalhado pelos bolsos do sobretudo fosse de
má qualidade… Talvez estas traças não respeitassem nada
nem ninguém, nem sequer senhores de sobretudo ou
sobretudos sem senhores…
– Logo na lapela, tão à vista de toda a gente. Podiam
antes ter traçado o forro ou as abas, atrás. Assim,
inutilizaram-me o sobretudo. Não tem remédio.
Devia haver uma maneira de avisar as traças a não
roerem lapelas, golas e peitilhos de casacos e sobretudos.
Talvez mudassem de hábitos.
Eu, neste Inverno, particularmente frio, tenho andado de
sobretudo, o azul-escuro de lã macia, o traçado… Mas com
uma particularidade: sempre com uma flor na lapela.
É para tapar os buracos feitos pelas traças. Os meus
amigos não sabem e dizem-me que ando com um ar
festivo.
– Andas tão alegre, neste Inverno – comentam.
Se eles soubessem…(Fonte:Antonio Torrado)

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